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Uma pessoa que não queira mais viver provavelmente não vá se sentir integrada ao meio e nessa ruptura há o que costumo dizer “excesso de mundo”. Não há ossinho da sorte nem filtragem de pensamento espinhoso. As estruturas pessoais perdem-se num vazio sem fim. O vazio sem fim é a desesperança. Uma pessoa que não queira mais viver não vai lhe dizer isso, então tudo que você vai precisar fazer é tentar ajudá-la a ficar aqui.
 
Ficar aqui significa estar de um modo ou de outro integrado. Durkheim escreveu há muito tempo um livro sobre suicídio com uma ampla pesquisa feita e uma particularidade desses achados foi que os Judeus tendiam a se suicidar menos. A explicação era a de que tinham uma boa integração em comunidade e mesmo diante de novos conhecimentos não abandonavam seus credos, voltavam-se, pelo contrário, a eles, como algo certo. Isso não significa que para nos suicidarmos menos teríamos que ser todos judeus. Mas há algo interessante aí. Há algo no mínimo interessante em saber que se voltar para a comunidade-base ou um credo possa de algum modo fortalecer estruturas nessas condições (não que, aliás, o contrário não possa ser verdadeiro em outras).
 
Mas falávamos sobre o que alguém que não queira mais estar aqui não vai te contar. E ele ou ela não vai te dizer que, de algum modo, a vida perdeu o sentido e que isso muitas vezes estará ligado ao fato de que alguma outra coisa foi perdida e essa coisa poderá ser uma pessoa ou um tipo de vida almejado ou outrora tido que se perdeu para dar lugar ao vazio. E o vazio é como o Nada que ia consumindo Fantasia, o lugar fictício de A História Sem Fim. Ali, o Nada eliminava possibilidades de imaginação. E uma pessoa que não queira mais viver não vai te dizer que dentro dela restou apenas o Nada de que ela anda cansada.
 
Há muitos sinais que essa pessoa poderá dar. Se procurarmos por aí, vamos encontrar que ela irá dizer que quer dormir para sempre ou que está cansada de viver. Há, além do mais, acontecimentos sobre os quais não temos controle que vão ser, como disse o apóstolo Paulo em meio às perseguições que sofria, “de desesperar a vida”. A esperança está calcada naquilo que não se vê, como a fé de que se fala em Hebreus.  Mas uma pessoa que não queira mais ficar aqui não sabe nada disso. Então, a gente só fica ali perto dela, ouvindo, escreve para ela, diz uma coisa ou outra para ela, até, quem sabe, ela ouvir. Ou a esperança nascer de novo.

09/2019


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